Aula pública: pesquisador terena e pesquisadora da UFMS enfatizam empoderamento de índias e índios



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Mesa: Valdinez Gabriel e Maria Helena da Silva Andrade (Fotos: Arnor Ribeiro/ADUFMS-Sindicato)

A inter e a transculturalidade sem deixar de distinguir educação escolar indígena formal de educação indígena propriamente dita fora

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m componentes que contrastaram a aula pública da sexta-feira 11 de setembro que tematizou “Licenciatura Intercultural Indígena ‘Povos do Pantanal’/UFMS como forma de transformação e empoderamento”, no Anfiteatro do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (CCHS-UFMS), ministrada pela Professora Doutora Maria Helena da Silva Andrade, da UFMS, e pelo mestrando em Ciências Ambientais e Sustentabilidade Agropecuária, Valdinez Gabriel (terena da aldeia Buriti, município de Dois Irmãos do Buriti) na Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).

O componente histórico foi destacado por Valdinez como central na tradição oral da etnia terena. “Jamais deixamos pra trás a história nossa.” O estudante de pós-graduação explicou que o conhecimento fora da escola tem como norteadores/as os anciões e as anciãs de seu povo. “Temos que ficar atentos para a educação que queremos”, admitiu Valdinez ao falar sobre a educação institucionalizada pelo Estado Nacional.

Valdinez enumerou uma série de ações que são desenvolvidas na Buriti por meio do empoderamento dos/das terenas. Entre as atividades estão organização de mulheres, resistência cultural e Feira Indígena. A catalogação de ervas medicinais da tradição terena, tendo como referência os conhecimentos das anciãs e dos anciãos, é um dos desafios listados pelo acadêmico de pós-graduação da Católica Dom Bosco, que tem como coorientadora a professora Maria Helena.

A mudança de mentalidade por parte de poder público em relação às/aos indígenas, em função do empoderamento que esses povos vêm conquistando foi lembrado por Valdinez. O pós-graduando criticou as políticas desenvolvidas pelo antigo Serviço de Proteção aos Índios (SPI) extinto em 1967 e depois pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que fizeram com que as etnias perdessem seus referenciais culturais específicos. Ele argumentou que só houve avanço após o componente educacional de populações indígenas sair da Funai e passar a ser responsabilidade do Ministério da Educação (MEC).

Necessariam

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ente se trabalha na perspectiva na qual se encaixa uma frase de Marcos Terena – “posso

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ser o que você é, sem deixar de ser quem sou!” –, apresentada pela professora Maria Helena em uma das sequências da aula pública. A docente ministra aulas no Curso de Licenciatura Indígena do

Campus

de Aquidauana (CPAQ), da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Nessa perspectiva, o ensino  que respeite as especificidades de cada cultura, de cada tradição indígena, está embasado nas Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei 9.394, de 20/12/1996) que no seu artigo 78, explicado pela pesquisadora Maria Helena, enfatiza “princípios fundamentais para que a ‘União, com a colaboração das agências federais de fomento à cultura e de assistência aos índios’ ”, desenvolva “‘programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar bilíngue e intercultural aos povos indígenas’”. Completa a docente citando o artigo 79 da LDB :  “‘a União’ deve apoiar ‘técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento da educação intercultural às comunidades indígenas, desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa’ com ‘os seguintes objetivos: fortalecer as práticas socioculturais e a língua materna de cada comunidade indígena; manter programas de formação de pessoal especializado, destinado à educação escolar nas comunidades indígenas; desenvolver currículos e programas específicos, neles incluindo os conteúdos culturais correspondentes às respectivas comunidades; elaborar e publicar sistematicamente material didático específico e diferenciado’.”

Com esses propósitos foi implantado o curso Licenciatura Intercultural Indígena Povos do Pantanal no CPAQ-UFMS por meio do Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciaturas Interculturais Indígenas (Prolind) do Ministério da Educação (MEC).

A professora Maria Helena historiou o percurso de implantação da Licenciatura Intercultural Indígena Povos do Pantanal. O curso teve suas raízes fincadas no Núcleo de Pesquisas em Questões Indígenas da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) em 2002, a partir de um trabalho desenvolvido pela Professora Doutora Onilda Sanches Nincao, atualmente coordenadora da Licenciatura Intercultural Indígena no CPAQ. A proposta inicial teve como “objetivo formar professores indígenas para os conteúdos curriculares das séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio, (a formação de professores indígenas para atuar na Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental já era feita pelo Curso de Licenciatura Normal Superior Indígena na UEMS)”, recorda Maria Helena.


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Instituiu-se em 2003 a “comissão interinstitucional: UEMS, UFMS e UCDB”, cuja finalidade era “elaborar o Proj

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eto Pedagógico do Curso de Licenciatura Intercultural para professores indígenas das etnias de Mato Grosso do Sul. A conjuntura política à época fez com que a referida comissão optasse por atender apenas o povo guarani. A professora Maria Helena acrescenta que houve a “aprovação da proposta de Licenciatura Intercultural Indígena para os guarani no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão” da UEMS.

A Licenciatura atendia somente o etnoterritório do Cone Sul de Mato Grosso do Sul, restrita aos/às guarani. Era preciso estender o curso à população indígena do etnoterritório Povos do Pantanal, no qual vivem os atikum, guató, kamba, kadiwéu, kinikinau, ofaié-xavante e terena. Criou-se então, segundo Maria Helena, “nova comissão para atender a demanda dos Povos do Pantanal, tendo à frente um representante do povo terena”.

“Entre 2007 e 2008”, rememora a pesquisadora, “lideranças indígenas, professores indígenas, o Comitê de Educação Escolar Indígena do Estado de Mato Grosso do Sul e a Secretaria de Estado de Educação do Estado de Mato Grosso do Sul” encaminharam “ao Departamento de Educação da Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul,

Campus

de Aquidauana, documento solicitando o oferecimento de formação superior para professores das etnias” que formam os Povos do Pantanal.

Esse engajamento resultou na preparação de projeto que contemplasse singularidades das etnias dos Povos do Pantanal para o futuro curso, em reuniões com indígenas e secretarias municipais de Educação, afunilando-se “em proposta” que “foi apresentada no Edital n° 3 Prolind/Secad” (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade) em 2008.

O projeto passou por readequação com o consequente funcionamento da “Licenciatura Intercultural Indígena” Povos do Pantanal, “a primeira turma iniciando suas aulas em 2011”, observou Maria Helena, com 120 estudantes. Noventa e nove deles/delas graduaram-se em 2014. “A importância do curso de Licenciatura Indígena para nós da comunidade Pilad Rebuá, Aldeia Passarinho [terena, município de Miranda], é a realização da possibilidade de trabalhar de acordo com a nossa realidade, mostrando para nossos alunos a importância de manter a nossa identidade indígena sem perder a oportunidade de conhecer outras realidades, novos experimentos, sempre demonstrando o valor da natureza”, analisa Juscelene Correa.

A Licenciatura estrutura-se na modalidade pedagogia da alternância com etapas presencial (TU), no

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da UFMS em Aquidauana, e de atividades nos polos (TC). São oito polos nas comunidades indígenas.

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Para cursar essa licenciatura, os índios e as índias enfrentam obstáculos socioeconômicos, como favelização (os guató, por exemplo), desaldeamento e taxas de alfabetização muito aquém do necessário nas terras indígenas, além do aspecto geográfico (distância). De acordo com a professora Maria Helena, um/a guató, que vive no Pantanal, no extremo noroeste de Mato Grosso do Sul, tem de viajar três dias de barco para assistir às aulas presenciais.  Em comunidades como essa, o meio mais eficiente de comunicação a distância é o rádio, por meio do qual os/as alunos/as são avisados/as das aulas.

Essas “cercas” sociais e geográficas não tiram o entusiasmo das/dos indígenas pelos estudos. Maria Helena explicou que a Licenciatura Intercultural Indígena exemplifica essa determinação. São pessoas que querem estudar, ser doutores/as, mas sem perder seu pertencimento. A pesquisadora apontou que os/a indígenas hoje são antropólogos, historiadores…, que não abandonaram suas aldeias.



Assessoria de Imprensa da ADUFMS-Sindicato