Future-se ameaça vinculação constitucional de recursos para universidades federais







Maria Dilnéia:



o povo não cabe mais no orçamento

” – Fotos: Arnor Ribeiro/ADUFMS Seção Sindical ANDES Sindicato Nacional


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PROGRAMA FUTURE-SE

, proposto às universidades e institutos federais públicos pelo Ministério da Educação (MEC), esconde a intenção de desvincular a obrigação constitucional de o Estado garantir recursos para as políticas sociais, nas quais se inclui a educação. Pesquisadora de temas relacionados a financiamento da educação, a professora titular aposentada da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Maria Dilnéia Espíndola Fernandes, interpreta essa atitude do Governo Bolsonaro (PSL) como uma forma de atacar o pacto social estabelecido na Constituição Federal de 1988.

“O Future-se vem na negação de tudo isso: [pacto social e vinculação constitucional]. E ele soma com essa perspectiva de que, como nós estamos no momento histórico em que o povo não cabe mais no orçamento, o fundo público não vai mais ser direcionado para a reprodução das vidas das pessoas que precisam do Estado no campo da saúde, da educação, da assistência social, da segurança pública etc. Então, o que se faz? Se faz a desvinculação constitucional de recursos”, descreveu e questionou a docente.

A pesquisadora esquadrinhou as conjunturas pelas quais passou o modelo de universidade implantado no Brasil a partir da década de 1970, ainda durante a ditadura civil-militar. Maria Dilnéia historiou as políticas do Estado brasileiro para o ensino superior, arquitetadas por setores que exerceram/exercem hegemonia sobre toda a população.

Com a promulgação da Carta Magna no crepúsculo da década de 1980, ocorre a estruturação do que a professora chama de “um novo pacto social”, para assegurar direitos como educação básica, universidade e saúde. “Esse pacto social, que vai ter nessa constituição o seu fiador, vai colocar então, também pra sociedade brasileira, ali no final dos anos de 1980, uma outra perspectiva de Estado de Direito Democrático Social, de forma muito mais ampliada. Nessa ampliação dos direitos há uma ampliação bastante significativa dos recursos para financiar aquilo que a gente chama de manutenção e desenvolvimento da educação no Brasil. Ainda que em 1983 isso tivesse uma certa normatização, uma lei que ficou conhecida como a Lei Calmon, é sobretudo com o pacto social construído com a Constituição Federal que a gente vai ter a síntese na lei, que é uma síntese da combinação que a educação precisa ter um dinheiro certo e líquido. E é por isso que a gente chama isso – nós os pesquisadores do financiamento da educação – de vinculação constitucional de recursos”, expôs Maria Dilnéia. O pacto social vem sendo corroído por meio de propostas de Estado mínimo levadas ao extremo pelo Governo Bolsonaro.

O propósito de desvinculação de recursos afeta diretamente a introdução de políticas sociais e a ampliação das já existentes.  “Está em xeque neste momento histórico aquele pacto que a gente conseguiu construir lá atrás, que foi afiançado pela Constituição Federal de 1988. E aí não é só pra educação. Isso também é pra saúde”, explicou Maria Dilnéia.







Pesquisadora na roda de conversa “Educação em tempos de crise”

A pesquisadora Maria Dilnéia historiou a trajetória que marcou a afirmação de uma política de acesso à educação universitária no Brasil. Ainda que timidamente, as políticas desenvolvidas a partir da última década propiciaram aumento do número de matrículas em cursos superiores. “A partir de 2002, com ampliação das matrículas, ampliação de concursos de professores, começa a chegar à universidade pública federal brasileira mais gente. Democratizam-se as vagas. É uma democratização ainda muito baixa. Em 2003 nós tínhamos na universidade brasileira matriculado só 9% da população brasileira. Isso significa dizer que, de cada grupo de cem jovens, de 18 a 24 anos, nós só tínhamos nove matriculados”, apontou a docente.

O lado perverso desse cálculo se revela nos percentuais de estudantes matriculadas/os em universidades pública e particular. Maria Dilnéia disseca essa desproporção. Segundo ela, dos 16% de estudantes na faixa etária de 18 a 24 anos matriculados no ensino superior brasileiro em 2017, significativos 72% estão na educação superior privada. Os 28% restantes ingressaram na educação superior em instituições estatais federais e estaduais. “As matrículas na universidade pública brasileira hoje, juntando todas elas, nós não chegamos a dois milhões”, calcula a pesquisadora. No total são em torno de sete milhões, ou um pouco mais, matriculados na educação superior (sistemas público e privado).

A educação superior entra nessa lista de desmonte no que se refere à destinação de dinheiro público para pesquisa, ensino e extensão. “O Future-se se coloca nessa lógica de negar a universidade que a gente conseguiu construir no país”, advertiu a pesquisadora na perspectiva de intensificar a organização social e política que defenda as instituições universitárias públicas laicas e democráticas.

A Universidade Federal de Mato Grosso do Sul exemplifica o contraditório que vêm ocorrendo nas instituições públicas de ensino superior no que diz respeito à autonomia e à democracia. Durante a Greve Nacional da Educação, na UFMS não houve cessão de auditório para a realização de julgamento simulado que tinha no banco o réu Future-se. “É essa universidade que a gente tem aqui, com todas as suas tensões, com todas as suas contradições, com todos os seus nãos. A gente teve que fazer um júri no corredor, que a gente não podia usar as instalações do espaço público”, admitiu Maria Dilnéia.

Roda de conversa

– Essas considerações da professora aposentada, a pesquisadora Maria Dilnéia Espíndola Fernandes, ocorreram na roda de conversa


Educação em tempos de crise


no dia 2 de outubro na Concha Acústica da UFMS, Cidade Universitária Campo Grande. O evento reuniu docentes, acadêmicas/os e técnicas/os administrativas/os. Fez parte da programação da Greve Nacional da Educação, que também teve atividades no 3 de outubro. A

ADUFMS Seção Sindical ANDES Sindicato Nacional

, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e dos Institutos Federais de Ensino, no Estado de Mato Grosso do Sul (

Sista-MS

), o Diretório Central das e dos Estudantes (

DCE-UFMS

) e o

Comitê Eu Defendo a UFMS

organizaram a programação realizada nos dois dias.



Assessoria de Imprensa da ADUFMS Seção Sindical ANDES Sindicato Nacional