No último dia 17, a ANDIFE (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) juntamente com mais 59 entidades da educação e da saúde publicaram o MANIFESTO: OCUPAR ESCOLAS, PROTEGER PESSOAS, VALORIZAR A EDUCAÇÃO.
O Documento assinado por organizações de todo o Brasil propõe iniciativas para uma retomada das aulas do ensino público brasileiro levando em conta a necessidade imperiosa de proteção à vida e à saúde dos alunos, professores e trabalhadores da educação, tendo em vista as graves consequências que a falta de responsabilidade na coordenação adequada deste retorno pode trazer à sociedade.
Confira abaixo trechos do Manifesto e os pontos-chave propostos:
OCUPAR ESCOLAS, PROTEGER PESSOAS, VALORIZAR A EDUCAÇÃO
(…)Para recomendar a reabertura ou não de escolas e universidades, os organismos
internacionais e nacionais citados em rodapé, têm considerado basicamente três
condições: (i) a taxa de transmissão comunitária; (ii) a capacidade de identificar e
bloquear cadeias de transmissão, com estrita articulação das instituições educativas à
vigilância em saúde; e (iii) adaptação do ambiente escolar para facilitar o cumprimento
do distanciamento físico, as medidas de higiene e as medidas pedagógicas.
Entretanto, o problema da abertura de unidades educacionais é complexo e não se resume aos surtos locais no interior dessas instituições. Tem a ver com vários fatores, como: aumento da circulação de pessoas; interação entre trabalhadores da educação, estudantes e famílias –essas duas razões reforçam a recomendação de verificar se há baixa transmissão comunitária. A alta proporção de assintomáticos ou sintomáticos leves justifica o segundo critério: capacidade de detectar e isolar casos, e controlar a quarentena de expostos. Isso também indicaria os limites de medidas voltadas só aos sintomáticos (como por exemplo,controle de temperatura) e a necessidade de assegurar a ampla capacidade de testagem da presença do vírus.(…)
(…)Para enfrentar os dilemas paralisantes e desorganizadores provocados pela
ausência de planejamento e de ações coordenadas entre a União e os demais entes
federativos, junto com a sociedade civil, incluindo profissionais da educação, saúde e da
assistência social, torna-se imperativo convergir energias, juntar forças e cerrar fileiras
com movimentos, fóruns, redes, entidades e demais coletivos dos campos da Educação e
da Saúde. É preciso, sobretudo, exigir o cumprimento da Constituição Federal no tocante
aos direitos sociais, especialmente, saúde, educação e assistência social.(…)
(…)Nos termos deste documento, iniciativas para retomada de atividades escolares em
qualquer nível do sistema de educação, seja nacional, estadual ou local, precisam estar
coordenadas e devidamente amparadas em políticas e integradas num plano estratégico
nacional de enfrentamento da epidemia, construído de modo participativo e conduzido
democraticamente. Tudo isso sem negligenciar as questões atinentes ao direito à educação
com qualidade socialmente referenciada para todos, tendo como fundamento a
Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, ressaltando a
responsabilidade dos governos de enfrentar as tragédias sociais impostas à nossa
juventude: quase um terço dos jovens brasileiros encontram-se neste momento
desempregados e desalentados.
Nesse contexto, compete ao Estado investir na ampliação
das matrículas na educação básica, no ensino superior, técnico e tecnológico – tendo como
horizonte as metas do Plano Nacional de Educação –, bem como garantir, à luz da
autonomia Universitária, formas de oferta equitativa e com qualidade para o ensino
superior durante e após a pandemia.
O retorno das atividades presenciais deve ocorrer de modo articulado à implementação
de medidas de saúde pública para controle da pandemia e de ações direcionadas ao
atendimento pedagógico das comunidades escolares. Para isso, será preciso promover
estreita integração entre redes escolares, universidades e centros de pesquisa com os
serviços do SUS, em especial as equipes da Estratégia Saúde da Família e da Vigilância
Epidemiológica, presentes em seu território de atuação. As atividades de vigilância em
saúde (vigilância sanitária e vigilância epidemiológica) devem integrar esse esforço. A
primeira, como apoio para a avaliação e a indicação de medidas relativas aos ambientes,
instalações produtos, serviços e rotinas de funcionamento que aumentem a segurança
contra a transmissão do vírus. A vigilância em saúde, em ação coordenada com a ESF,
deve trazer conhecimento e instrumentos para o monitoramento, a identificação oportuna
de casos suspeitos, o rastreamento de contatos e a adoção de medidas para reduzir a
transmissão do SARS-CoV-2, como isolamento, quarentena, testes para diagnóstico e
orientação sobre cuidados adicionais. As equipes multiprofissionais de saúde podem e
devem articular-se às comunidades escolares, em particular o Programa Saúde na Escola
que mobiliza ações em comum, integradas às políticas de assistência social. As secretarias
municipais, estaduais e o Ministério da Saúde têm a responsabilidade de monitorar as
informações sobre o comportamento da doença nas instituições de ensino, analisá-las e
dar transparência plena aos dados, de forma a identificar circunstâncias de risco e
experiências de sucesso que possam ser reproduzidas.
A estratégia de ocupar escolas, proteger pessoas e valorizar a educação significa reforçar
as instâncias colegiadas e de representações dos diversos segmentos, cultivar, sempre
mais, relações de confiança entre os integrantes da comunidade escolar: gestores/as,
diretores/as, docentes, profissionais, estudantes e famílias, sem prescindir do efetivo
papel do Estado no sentido de estabelecer políticas intersetoriais e assegurar recursos face
as necessidades sanitárias e pedagógicas que o contexto requer. Este é o momento de
mobilizar as energias criativas e as forças políticas para promover avanços em direção a
uma educação democrática e inclusiva, necessária para enfrentar os desafios que se
sucedem, garantindo o seu caráter público, gratuito, laico, de gestão pública e de
qualidade socialmente referenciada. Uma educação que conecte o cotidiano da escola
com as questões urgentes da sociedade: superação das desigualdades socioeconômicas,
respeito aos direitos humanos, valorização da ciência e da informação, reconhecimento e
valorização da diversidade, reconhecimento de outros saberes do bem viver.
Uma educação integral, sonhada por Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, Paulo Freire,
patrono da educação brasileira, e tantos outros, implica gestão democrática. A democracia
vai estimular que cada um, de acordo com suas responsabilidades, sinta-se parte da
comunidade escolar, defendendo os direitos coletivos, e contribua, com suas
possibilidades, para um ambiente de aprendizagem seguro, alegre e solidário. A escola,
equipamento público, patrimônio social e ativo comunitário, terá enfim condições de,
como afirmou Paulo Freire, assumir seu papel de “centro de debates (…) onde a
organização popular vai sistematizando sua própria experiência”, condição crucial para
realizar o sentido da educação como condição de liberdade.
PONTOS-CHAVES:
1. É urgente um plano estratégico nacional de enfrentamento da pandemia da COVID-19, com políticas nacionais articuladas, com destaque para as áreas de saúde, educação, assistência social e trabalho, construído com todas as esferas de governo e ampla participação da sociedade, respeitando as especificidades territoriais, visando soluções que considerem a cruel desigualdade social.
2. Um plano específico para a educação, construído e conduzido democraticamente, com a participação ativa de professores, estudantes e seus responsáveis e demais profissionais da escola, deve amparar os processos formativos, incluindo as atividades pedagógicas, em todos os níveis de ensino e esferas administrativas – nacional, estadual, distrital, municipal e local – do sistema de educação.
3. Como eixo central da ação organizada da sociedade, deve-se ocupar os espaços institucionais da educação para a escola pública, mediante a retomada dos processos formativos, numa perspectiva republicana de resistência criativa e de solidariedade com as comunidades escolares e acadêmicas, contribuindo para superação dos retrocessos nas políticas públicas e das alternativas cartoriais e privatistas, que afetam toda a sociedade e, sobretudo, os estudantes mais pobres e vulneráveis.
4. Para ocupar-proteger-valorizar as instituições escolares, deve-se garantir condições sanitárias e pedagógicas efetivas, com os necessários cuidados de proteção individual e coletiva, para que a frequência às atividades e processos formativos seja segura para todos os integrantes da comunidade escolar e acadêmica.
5. É preciso valorizar a educação como construção de valores e a escola como espaço de formação cidadã, de criatividade e compartilhamento, de uma visão crítica da sociedade, de promoção de uma cultura de paz, de valorização do espaço público, de solidariedade, colaboração e transformação social.
6. Escolas, profissionais de educação e estudantes, especialmente aqueles em situação de vulnerabilidade, precisam contar com equipamentos e acesso à internet de alta velocidade, sem ônus, garantidos pelo poder público. Todas as instituições de educação públicas do país devem contar com condições necessárias para atender professores, estudantes e famílias, apoiando as comunidades onde estão localizadas;
7. São necessárias alternativas pedagógicas que visem a materialização de processos formativos e avaliativos contextualizados, democráticos e emancipatórios, contrapondo-se, portanto, às políticas que tratam a avaliação como medida de resultado e instrumento de controle, ranqueamento, concorrência e competividade no campo educacional e institucional.
8. A reorganização das escolas e das atividades formativas não deve ser confundida com a simples apresentação de medidas autoritárias, burocráticas, padronizadas e descontextualizadas para substituição ou reposição de aulas ou subsunção ao calendário escolar.
9. As comunidades escolares se compõem de sujeitos capazes de, se bem informados, seremprotagonistas no debate sobre reabertura ou não de escolas, e em que condições, emconsonância com o princípio constitucional da gestão democrática da escola pública,observando-se pleno e rigoroso cumprimento de protocolos científicos e pedagógicos.
10. As características específicas de cada território, grupos de docentes e de estudantes, famíliase comunidade, tais como necessidade de deslocamento, condições de isolamento físico epresença de vulnerabilidades, devem ser levadas em conta nas discussões e decisões sobre aocupação das escolas.
11. Os poderes públicos, devem organizar a formação de comitês especiais com a função derealizar diagnóstico de situação, definição de prioridades, estratégias e ações, bem como omonitoramento da pandemia, por escola, por município ou localidade, com representação dacomunidade escolar, da saúde, da educação, da assistência social e também da sociedade quehabita o território.
12. O retorno das atividades presenciais deve ocorrer de modo articulado à implementação demedidas de saúde pública para controle da pandemia e de ações direcionadas ao atendimentopedagógico das comunidades escolares.
13. É essencial que as autoridades federais, estaduais, distrital e municipais, bem como osgestores dessas redes de ensino, garantam as condições de espaço físico, organizaçãopedagógica adequada e materiais para o funcionamento das escolas, com a aquisição deequipamentos de segurança, insumos de higienização, contratação de pessoal, necessáriospara redução dos riscos de contaminação.
14. Movimentos sociais e organizações dos campos da saúde e da educação devem ser chamadosa apoiar a população neste momento crítico da pandemia, promovendo reflexões eproposições intersetoriais, envolvendo setores da gestão pública que incluem educação,saúde, assistência social, transporte, planejamento, economia, esportes, cultura e segurança.
15. É preciso integrar os sistemas educativos com os serviços do SUS, em especial as equipesmultiprofissionais de saúde da Estratégia Saúde da Família, em seu território de atuação e devigilância em saúde, mobilizando ações conjuntas em apoio às comunidades escolares, emparticular o Programa Saúde na Escola.
16. Não podem ser aceitas ameaças aos direitos das pessoas com deficiência e, tampouco, que nomomento da pandemia, haja retrocessos nas políticas de educação inclusiva ou deixem de sercumpridas as orientações de Convenção Internacional assinada pelo Brasil.
17. A garantia de qualidade social da educação deve se basear em padrões de qualidade, processosregulatórios e de avaliação institucional emancipatórios e inclusivos na educação, inclusivena modalidade à distância; não podem prosperar tentativas de tratar a educação comomercadoria e a redução dos processos formativos a atividades não presenciais, cartoriais eburocráticas, sem a garantia de efetivas condições e acompanhamento pedagógicos.
18. É preciso garantir a destinação de recursos do Fundo de Universalização dos Serviços deTelecomunicações (FUST), correspondendo atualmente a 31 bilhões de reais, com efetivocontrole social, para garantir plataforma pública e internet de alta velocidade para todas asinstituições de educação básica e superior públicas do país, com garantia de acesso gratuitoaos profissionais da educação e estudantes, especialmente aqueles em situação devulnerabilidade.
19. O FUNDEB deve ser regulamentado como fundo robusto e permanente, com a efetivainstituição do Custo Aluno-Qualidade (CAQ), como realidade e referência de justiçafederativa, aliando qualidade e financiamento, com preservação de fontes orçamentárias epercentuais para pagamento dos profissionais da educação, sendo os recursos do SalárioEducação exclusivamente destinados aos programas complementares, com ampliaçãoprogressiva da complementação da União, sem destinação de recursos via políticasmeritocráticas ou vouchers.
20. Reafirma-se a necessidade de fortalecimento da educação pública e gratuita, laica,democrática, de gestão pública, sendo assegurada a destinação de recursos públicosexclusivamente para as instituições públicas.
21. A responsabilidades do Estado na educação são inalienáveis, não podendo ser transferidas à iniciativa privada, sob forma de privatização ou terceirização; repudiam-se todas as agressões aos direitos trabalhistas dos profissionais da educação, intensificados durante a pandemia, inclusive no que tange à formação continuada.
22. São inaceitáveis os processos de intensificação e precarização do trabalho docente, devendo ser respeitados e fortalecidos os coletivos docentes na construção criativa e autônoma de seu trabalho pedagógico.
23. A efetiva valorização dos profissionais da educação, pública e privada, (professores/as,técnicos/as, funcionários/as administrativos/as e de apoio), deve ser garantida por políticas deformação inicial e continuada, estruturação e fortalecimento das carreiras, salário digno(assegurado o cumprimento de piso salarial profissional nacional para os profissionais daeducação), redução da carga horária e do número de turmas por professor, condições erelações democráticas de trabalho.
24. A pandemia da COVID-19 impõe a necessidade de cumprimento dos dispositivos da Constituição Federal, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, do Sistema Único de Saúde e do Plano Nacional de Educação, visando à garantia do direito à saúde e à educação pública com qualidade-equidade.
As entidades abaixo-assinadas subscrevem este Manifesto:
1. ABdC – Associação Brasileira de Currículo
2. ABEN – Associação Brasileira de Enfermagem
3. ABRASCO – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
4. ABRASTT – Associação Brasileira de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora
5. ABrES – Associação Brasileira de Economia da Saúde
6. ANDIFES – Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de
Ensino Superior
7. ANFOPE – Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
8. ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
9. Avante Educação e Mobilização Social
10. CEBES – Centro Brasileiros de Estudos de Saúde
11. FORPIBID – Fórum Nacional dos Coordenadores Institucionais do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
12. Frente Ampla em Defesa da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora
13. Movimento de Inovação na Educação
14. PROIFES – Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições
Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico
15. Rede COVIDA – Ciência, Informação e Solidariedade
16. Rede Nacional Primeira Infância
17. Rede Unida
18. RNMMP – Rede Nacional de Médicos e Médicas Populares
19. SBB – Sociedade Brasileira de Bioética
20. SBEM – Sociedade Brasileira de Educação Matemática
21. SBEN-Bio – Associação Brasileira de Ensino de Biologia
22. SBHE – Sociedade Brasileira de História da Educação
23. SBMFC – Sociedade Brasileira de Medicina da Família e Comunidade
24. SBMT – Sociedade Brasileira de Medicina Tropical
25. SOBRASP – Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do
Paciente
26. Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil
27. Instituto Sérgio Miranda
28. Observatório Sindical Clodesmidt Riani
29. Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas
30. Comunidade Educativa CEDAC
31. NEPEI-Núcleo de Estudos e Pesquisas em Infância e Educação Infantil/UFMG
32. LATESFIP/USP – Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise/USP
33. CIESPI/ RJ – Centro Internacional de Estudos e Pesquisa sobre a Infância do Rio
de Janeiro
34. Usina da Imaginação/SC
35. Instituto Árvores Vivas para Conservação e Cultura Ambiental/SP
36. CONTEE – Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino
37. Fórum de Educação Infantil de Belo Horizonte
38. SEFRAS – Serviço Franciscano de Solidariedade
39. CREI – Centro de Referências da Educação Integral
40. Fórum Amapaense de Educação Infantil
41. Fórum do Agreste Paraibano de Educação Infantil
42. Fórum Gaúcho de Educação Infantil
43. Fórum de Educação Infantil de Pernambuco
44. Fórum de Educação Infantil do Pará
45. Fórum de Educação Infantil da Região Central do Rio Grande do Sul
46. Fórum de Educação Infantil do Distrito Federal
47. Fórum de Regional de Educação Infantil do Planalto/ RS
48. Fórum Permanente de Educação Infantil do Espírito Santo
49. Fórum Baiano de Educação Infantil
50. Fórum Mineiro de Educação Infantil
51. Fórum Permanente de Educação Infantil de Novo Hamburgo – RS
52. Fórum de Educação Infantil do Paraná
53. Fórum Paulista de Educação Infantil
54. Fórum de Educação Infantil do Ceará
55. Fórum Permanente de Educação Infantil da cidade de Coxilha/RS
56. AMPLIE – Aliança de Mães pela Liberdade de Ensinar
57. GP Fortis/Uneb – Grupo de pesquisa Formação Trabalho e Identidades
58. CLIQUE – Grupo de pesquisa em Linguagens, Currículo e Cotidiano de bebês e
crianças pequenas
59. ABMMD – Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia
60. ANPAE – Associação Nacional de Política e Administração da Educação