Em meio à maior crise sanitária já enfrentada pelo país devido à pandemia da Covid-19, e uma grave crise econômica, a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) anunciou a possibilidade de iniciar cobranças pelos atendimentos em saúde prestados pela Clínica Escola Integrada (CEI), que hoje oferece um leque importante de serviços em saúde para a população*, especialmente para a população que mais tem sofrido com os resultados da crise.
A CEI oferece atendimento gratuito em fisioterapia, enfermagem e nutrição para a população vulnerável. Vários serviços são encontrados apenas no CEI, como o “Projeto Respira”, que oferece fisioterapia respiratória para crianças, serviço que o próprio município não oferece via SUS.
Nesta sexta-feira, dia 26, a UFMS apresentou a proposta de cobrança pelos atendimentos e procedimentos realizados pela Clínica ao Conselho do INISA (Instituto Integrado de Saúde) no mesmo sistema de clínicas privadas. Pela proposta, se uma criança do Projeto Respira, por exemplo, precisasse de tratamento em longo prazo e vários exames na avaliação, cada um deles seria cobrado individualmente, como ocorre em muitos serviços particulares.
Apesar de concordarem com a necessidade de uma discussão sobre as formas de financiamento para sustentabilidade da Clínica Escola – o financiamento é feito pelo MEC, com repasses à UFMS – os Integrantes do Conselho e docentes dos cursos que compõem a CEI, questionam a cobrança de procedimentos aos pacientes, que deve tornar ainda mais precária a já difícil vida de quem precisa tanto desses atendimentos.“Seria um retrocesso. Especialmente em um momento como este, de pandemia, onde sabemos que as pessoas vulneráveis se tornam ainda mais vulneráveis, e que muitas outras, antes não vulnerabilizadas, passaram a depender dos serviços públicos de saúde”, ressalta um conselheiro.
De acordo com o presidente da ADUFMS, Prof. Marco Aurélio Stefanes, que acompanhou a situação desde o início, durante a reunião do Conselho, a questão principal levantada foi como pensar numa sustentabilidade financeira para a clínica. “Nesse sentido, ao invés de jogar essa cobrança para a população, nosso representante defendeu uma vinculação maior e mais forte com o SUS, dessa forma os protocolos e convênios poderiam ser assinados tanto com a prefeitura, como com o Ministério da Saúde”, explicou.
Stefanes pontuou que é importante que a população saiba que não existe nenhuma clínica escola dos cursos de fisioterapia das universidades públicas no país que cobre pelos atendimentos. “Esse seria o primeiro caso de cobrança no Brasil, se fosse implementado. Até mesmo o Conselho Nacional de Saúde estabelece que esses serviços não devem ser cobrados”, alerta.
Segundo o presidente da ADUFMS a reunião teve momentos de tensão mas o Conselho obteve uma vitória ainda que temporária. “Por hora, a questão saiu da pauta, mas a reitoria estava de fato usando muitos argumentos para contrapor os professores do Conselho que se manifestaram contra a cobrança. Mas os professores insistiram que o principal objetivo da Clínica escola é a formação de alunos, o ensino e a pesquisa e não a arrecadação de recursos”, adverte.
De acordo com uma das conselheiras, após a reunião ficou decidido que será criada uma comissão para discutir o assunto. A decisão é importante pois segundo os Integrantes do Conselho do INISA e docentes dos cursos que compõem a CEI não houve um amplo debate sobre o tema ou mesmo uma consulta prévia da parte da UFMS antes de anunciar a possibilidade de cobranças.
“Temos que lembrar que temos uma Constituição que diz que a saúde é dever do Estado e direito de todos. Que a Lei 8080 diz que o SUS é ordenador da formação de recursos humanos. Então, não cabe a uma instituição pública federal, que deve servir à sua comunidade, fazer esta cobrança a usuários que não têm condições de pagar por esses tratamentos”, alerta um conselheiro.
*Os atendimentos da CEI são realizados por meio por meio de estágios, projetos de extensão e pesquisa dos cursos de graduação e pós-graduação.