A retomada de um modelo de desenvolvimento da indústria nacional não tem perspectiva dentro do atual Governo Temer. A conclusão foi apresentada pelo professor e geógrafo, Manoel Rabelo Junior, do curso de Ciências Sociais da UFMS, na primeira aula do curso de extensão: “O Golpe de 2016 e a Crise da Democracia no Brasil”, organizada pelo Centro Acadêmico de Filosofia, com o apoio da ADUFMS-Sindicato e do Grupo Práxis UFMS.
O docente avalia que o impeachment da presidenta Dilma Rousseff representou o fim do ciclo de alianças da Nova República, firmado há cerca de 18 anos. A ênfase nesse período, considera, foi mais política do que econômica, pois o País apresentava, na época do impeachment da presidenta Dilma, uma reserva cambial de R$ 369 bilhões, o que lhe garantia certa estabilidade, mesmo com o aumento da dívida pública. Lembrou que o Brasil era o 4º credor da dívida pública americana, a maior do mundo.
Para o sociólogo, essa situação econômica foi proporcionada pelos recursos dos
commodities
(produtos primários com comercialização na Bolsa de Valores). Este desempenho permitiu certa autonomia política para o Brasil, reforçado com o pagamento da dívida externa, em 2005. A partir daí, o Brasil passou a cumprir novo papel no mercado internacional e na configuração dos blocos econômicos. A partir desta decisão passou a atuar numa nova configuração política no cenário internacional, agora, como protagonista. Citou como exemplo mudanças geopolíticas como a retração da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) bancada pela política externa norte-americana e a formação do G-20, para fazer frente às decisões do G-7, composto pelas nações mais ricas do Planeta. Para ele, o País assumiu também a posição de financiador externo via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES.
Resgatou que, anteriormente, o País viveu um período de estagnação de cerca de 30 anos, conseguindo nas eras Lula e Dilma retomar os investimentos em infraestrutura via Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e pelo desenvolvimento de tecnologia de exploração de petróleo em solo profundo, desenvolvido pela Petrobras, conjuntamente com a implantação do Pré-sal no modelo de sistema partilhado. Esse sistema, agora, foi alterado e parte dos lucros que seria destinado para a educação e a saúde, ficará no caixa das empresas multinacionais de energia.
Acrescentou que o País implantou um projeto nacional de desenvolvimento, batizado de “Brasil 2022”. Esse modelo tinha começo, meio e fim. Foi acompanhado com a aquisição de pacotes tecnológicos nas áreas de aviação, telecomunicações e bélica. Com a iniciativa, o País deixaria de ser importador e passaria a ter condições de exportar tecnologia nessas áreas estratégicas.
Para o pesquisador, o Golpe de 2016 foi construído com o apoio estadunidense, em razão da projeção que o País vinha alcançando internac
ionalmente. A forma de anular governos popularmente eleitos dentro dos parâmetros “legais” foi testada, anteriormente, em países menores como Honduras, em 2009, no impeachment do presidente paraguaio, Fernando Lugo, em 2012, e na Ucrânia, em 2013. Nesse mesmo ano, “coincidentemente”, estouraram as Jornadas de Junho contra o Governo de Dilma. Essas ações, combinadas com a crise econômica, criaram as condições para o impedimento da presidenta eleita. Naquele momento, explicou, ocorreu a ruptura com a governabilidade pós-Nova República.
Para o historiador, Dilma até que tentou se recompor com o empresariado nacional, numa tentativa de manter a hegemonia política, mas não conseguiu reverter o quadro.
A partir daí, com a condução de Temer à presidência, o País começou a ser submetido à normatização econômica de inspiração neoliberal, alicerçada nas políticas do Banco Mundial e do Consenso de Washington. Agora, vigoram os interesses internacionais sobre os nacionais, citando, como exemplo, a mudança do regime de exploração do Pré-sal e a retomada de privatização das empresas públicas.
O professor também fez a retrospectiva histórica da efetivação de golpes no sistema democrático brasileiro. Comparou que toda vez que o País passa por processos de modernização produtiva e de projeção no mercado internacional, os governos de aspirações populares são derrubados à revelia do processo democrático. Mencionou como exemplo as pressões para atender o mercado externo, que combinaram com o suicídio do então presidente Getúlio Vargas, a renúncia de Jânio Quadros e a destituição do presidente João Goulart. Nesses períodos, complementa, predominaram políticas econômicas com ênfase desenvolvimentista nacional, também incorporadas pelos governos militares. E, agora, mais recentemente, combinou com o impeachment da presidenta eleita Dilma Rousseff.
Lembrou que antes do Governo Lula, o País rezou a cartilha do Banco Mundial e do Consenso de Washington sob o comando de Fernando Henrique, com a predominância política do Estado Mínimo e a estagnação econômica. Nesse período, a Nação brasileira perdeu sua capacidade de planejamento e investimentos, com a venda de empresas estratégicas como a Vale do Rio Doce.
Este cenário, na visão do docente, rompeu-se com a eleição de Lula, retomando o papel do Estado como indutor do desenvolvimento econômico. Ao mesmo tempo em que reconheceu a importância do agronegócio na indução econômica do País, o estudioso criticou o conservadorismo e a agenda política imposta pelo agronegócio. Exemplificou que esse segmento social incorpora teses como a quebra das barreiras alfandegárias, enquanto os produtos americanos há mais de 150 anos contam com alta proteção de mercado contra a concorrência internacional. Este modelo internacional, abraçado por lideranças do segmento, “ mantém o País no modelo agrário exportador adotado historicamente, relegando outras potencialidades do País na produção e geração de tecnologias e na diversificação produtiva”.
O professor citou como sintoma desta política o congelamento do orçamento público por 20 anos, a retirada das empresas do País no setor de construção civil na África, espaço ocupado pelas empresas chinesas, o desemprego de mais de 24 milhões de brasileiros, a venda subavaliada das reservas de petróleo e, agora, as águas.
Enfatizou que o fortalecimento do Estado é crucial para o mercado, pois não existe liberalismo sem Estado e que a política do Estado Mínimo abre as portas do Brasil para outros países. No atual modelo, conclui, “ O Brasil não tem mais condições para desenvolver a indústria nacional”.
Assessoria de imprensa da ADUFMS