Alterações colocam docentes pesquisadores de instituições públicas a serviço do setor privado
O Código de Ciência, Tecnologia e Inovação, sancionado pela presidente Dilma Rousseff na última segunda-feira (11) por meio da lei 13.243/2016, além de aumentar as vias de privatização da educação pública, também flexibiliza o regime de Dedicação Exclusiva (DE) do magistério federal. O código modifica a lei 12.772/2012, que regula a carreira docente, possibilitando que empresas privadas paguem, por meio de fundações de apoio, bolsas a docentes. Outra mudança é o aumento da carga horária máxima destinada à pesquisa, extensão e inovação, que passa de 120h/ano para 416h/ano.
Giovanni Frizzo, 1º vice-presidente da Regional Rio Grande do Sul e um dos coordenadores do Setor das Instituições Federais de Ensino (Setor das Ifes) do ANDES-SN, critica o código e alerta a categoria sobre os problemas que ele pode trazer ao regime de DE. Para o docente, há dois pontos centrais nas modificações feitas pelo código na lei 12.772/2012. O primeiro é que os docentes podem receber bolsas por fora do previsto na carreira.
“A inclusão das fundações de apoio entre aqueles que podem pagar as bolsas cria um mecanismo com o qual as empresas pagarão bolsas aos docentes de forma indireta, utilizando a fundação de apoio como intermediadora. Ou seja, os docentes podem receber bolsas, para elaborar suas pesquisas, indiretamente das empresas privadas que estabelecerem convênios com as instituições de ensino via fundações. Boa parte da remuneração dos docentes, com a mudança da lei, pode ser paga por empresas privadas através dessas bolsas. A remuneração dos docentes, então, não será oriunda apenas do fundo público”, afirma Frizzo.
O segundo ponto é a alteração na carga horária máxima para atividades de pesquisa, extensão e inovação. “A mudança significa que o professor pode dispor de até oito horas semanais de sua jornada de trabalho para desenvolver suas atividades de pesquisa para a iniciativa privada. Ou seja, uma parte da jornada será destinada à produção de conhecimento para o setor privado”, completa o diretor do ANDES-SN.
A lei 13.243/2016 ainda modifica a 12.772/2012 em outro ponto. A partir de agora, as fundações de ditas de apoio e as Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs) poderão remunerar seus dirigentes, inclusive os com contrato de trabalho em regime de DE, desde que a remuneração bruta seja inferior a 70% do limite salarial para servidores públicos do poder executivo.
Influência do setor privado
Epitácio Macário, 2º vice-presidente do ANDES-SN e coordenador do Grupo de Trabalho em Ciência e Tecnologia do Sindicato Nacional, ressalta que a lei 13.243/2016 aumenta a influência da iniciativa privada sobre o público, abrindo radicalmente, e sem precedentes, a universidade pública à privatização.
“Responder às demandas do mercado passa a ser a função do professor pesquisador. Isto só pode ter um impacto negativo para a universidade. O fazer universitário passa a ser produto, o que é uma privatização muito mais profunda do que simplesmente você colocar um produto à venda no mercado”, avalia Macário.
Giovanni Frizzo também cita a proposta de mudança na carreira que o governo encaminhou ao ANDES-SN, no final de 2015, e rejeitada pelo Sindicato Nacional após decisão de assembleias gerais. A proposta prevê que a remuneração dos docentes federais será estabelecida a partir do regime de 20h, com aumento de 40% no vencimento base (VB) para o regime de 40h e de 100% para o regime de dedicação exclusiva. O ANDES-SN reivindica que o VB do regime de 40h seja o dobro (100%) da remuneração do regime de 20h e que o vencimento para Dedicação Exclusiva seja 210% maior que a remuneração para 20h.
“Com esta proposta, o governo quer, portanto, que o regime de dedicação exclusiva receba apenas o dobro do regime de 20h, o que torna o regime de DE pouco atrativo para os docentes, já que a remuneração corresponderia ao regime de 40h, o qual não limita o vínculo de trabalho do docente apenas a uma instituição”, diz Frizzo. Para o diretor do ANDES-SN, as mudanças trazidas pelo Código de Ciência e Tecnologia, somadas a essa proposta do governo, flexibilizam o regime de DE.
“A Dedicação Exclusiva fica seriamente comprometida. Assim como a carreira de maneira geral, já que fica mais facilitada a contratação via Organizações Sociais, que passarão a fazer contratos com os professores ou de prestação de serviço ou pela CLT. Anuncia-se o fim da carreira docente como a conhecemos”, completa Epitácio Macário, 2º vice-presidente do ANDES-SN.