Em visita a Campo Grande, a presidenta da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPED
, a professora da Universidade Federal do Paraná, Andreia Gouveia, esteve participando de encontro na Faculdade de Educação de Campo Grande, na quarta-feira (02.08), com docentes e estudantes dos cursos de pós-graduação em Educação. No evento fez um balanço do desmantelamento do Fórum Nacional da Educação, das investidas do setor privatista da educação no Governo Temer e conclamou professores e professoras a participar do Conferência Nacional Popular de Educação Popular. Na ocasião, a docente concedeu entrevista ao Jornal da ADUFMS falando dos grandes desafios para o setor.
JA – Quais desafios colocados para educação e o ensino superior brasileiro, pontos críticos, alternativas?
Nossa maior preocupação é com a execução do Plano Nacional de Educação (PNE), um plano que foi aprovado em 2014 com a perspectiva de ampliação e democratização do acesso ao ensino superior e também com o fortalecimento da pós-graduação e da relação entre a pós-graduação e o fortalecimento da educação básica. O grande elemento de fundo das nossas preocupações é o financiamento da educação, a aprovação da emenda noventa e cinco no final de 2016 e depois o golpe institucional, que afasta a presidente Dilma, coloca o corte na lógica do PNE que tinham colocado pra educação, com a ideia de um teto de gastos, que, na avaliação da ANPED, é um teto falso, no sentido de que a política pública não está devidamente desenvolvida, não garante ainda acesso e qualidade na educação brasileira para toda a população, e, portanto, não há sentido em você pensar um teto que só corrija os investimentos em educação, ou em saúde, ou nas áreas sociais todas a partir da avaliação da inflação. Porém, já estamos vivendo neste ano de 2017 os efeitos da Emenda 95, os orçamentos das universidades públicas já estão congelados, o número de bolsas do CNPQ e da CAPES para os estudantes de pós-graduação sofreu quedas significativas, os editais de pesquisa estão ou sendo executados ou muito lentamente ou não estão saindo, e a execução lenta significa, por exemplo, no caso do CNPQ: o edital que era anual, de apoio aos pesquisadores, nós estamos executando em 2017, o edital de 2016, portanto, no orçamento de 2017 não temos recursos para pesquisa, e isso tudo vai construindo a impossibilidade de execução do Plano Nacional de Educação. Acho que neste momento o nó crítico para a nossa ação é a condição de financiamento.
JA – As medidas adotadas pelo Governo Federal seriam uma forma de empurrar internamente as universidades públicas para o processo de privatização, buscando a captação de recursos e financiamentos na iniciativa privada?
AG – Acho que isso pode ser uma das consequências. Você tem o interesse específico do mercado educacional privado no ensino superior, isso é evidente nas últimas décadas, com o crescimento da participação do setor privado. Porém, tem uma outra preocupação que é o fato de que o setor privado brasileiro não faz pesquisa. Então, ainda que haja uma preocupação no sentido privatista do acesso e da venda de vagas no ensino superior, há uma preocupação de que ainda este processo de privatização possa nos levar a paralisar a possibilidade de fazer pesquisa. Se é essa a intenção da captação de recursos, ela compromete a longo prazo a capacidade do Brasil produzir conhecimento. É mais grave do que só o processo de privatização da oferta, que já é discutível, no ponto de vista do acesso. Hoje quem está fora do ensino superior tem cor, tem um determinado perfil de renda. Os dados do PNE mostram que a população mais pobre é quem está fora do ensino superior. Quando a gente pega os extratos mais elevados de renda no Brasil a gente já cumpre a meta do PNE, a gente não cumpre quando a gente tem esses outros, portanto uma expansão privatista é uma expansão que vai continuar marcando uma determinada exclusão do ensino superior. O esvaziamento da possibilidade de ampliação do acesso público pode sim ter esse plano de fundo do processo de privatização.
JA – Frente a essa conjuntura agora, quais são as alternativas?
Eu acho que nós estamos num momento de muita dificuldade de visualizar saídas, mas nós precisamos juntar a nossa possibilidade de fazer avaliação neste momento, e de interlocução. E pra isso eu acho que a grande estratégia é que os movimentos sociais e os movimentos dos sindicatos, as associações de pesquisa estão construindo é a Conferência Nacional Popular de Educação, que é uma resposta ao esvaziamento do Fórum Nacional de Educação por parte do Ministério da Educação de desrespeito a sua composição e o conjunto de entidades instituíram o Fórum Nacional Popular de Educação, tendo conta que a Conferência Nacional de Educação de 2018 está suspensa, nós faremos uma Conferência Nacional Popular de Educação, independente, autônoma, em abril do ano que vem. Este ano estamos convocando os Fóruns Estaduais e Municipais a fazer o debate nos estados e nos municípios para que a gente possa fazer coletivamente uma conferência no ano que vem e pensar a nossa atualização de lutas e de resistência e na nossa avaliação, um dos elementos chave disso é que nós precisamos reverter a Emenda 95.