A direção da ADUFMS Seção Sindical protocolou ofício junto à Reitoria da UFMS no dia 03 de agosto solicitando informações sobre a quantidade de matrículas e de disciplinas trancadas e o percentual de reprovação relativo ao primeiro semestre de 2020, referente ao período de Pandemia. A solicitação foi feita a pedido de diversos docentes associados e pesquisadores da área educacional para realizar um balanço do impacto das aulas remotas no processo de ensino e aprendizagem.
A resposta da administração da UFMS foi o relatório institucional publicado do BSE no mês de agosto. O documento mostra uma adaptação ao modelo inicialmente improvisado com impactos incertos sobre o processo de formação dos acadêmicos. Como as atividades práticas, aulas de laboratórios e estágios ainda não foram programados não há um quadro consolidado sobre este impacto na formação acadêmica.
Quanto à evasão e à retenção, embora o relatório apresente dados positivos neste quesito, acredita-se que o início do segundo semestre deveria ser melhor avaliado não somente no quesito gerencial que predomina no relatório, mas principalmente no aspecto didático-científico.
Na avaliação da diretora da ADUFMS da Seção Sindical do Campus de Três Lagoas, Professora Mariana Esteves de Oliveira, os docentes deveriam ter o máximo de acesso aos dados de forma compilada e fácil. “Não divulgar as informações de forma didática significa que a Universidade recusa a transparência para gente saber em que terreno estamos pisando”, criticou.
Diante da situação, a docente relata que a única maneira de fazer um balanço dos efeitos das aulas remotas é com base nas impressões e avaliações feitas coletivamente com os colegas de profissão.
Com base nas impressões, a pesquisadora sistematiza que o primeiro semestre foi marcado pelo improviso, em razão da imposição da forma do trabalho remoto, logo após a necessidade de se entrar em isolamento.” Aconteceu de um dia para outro, não tivemos tempo de preparo, planejamento, conversa e reflexão. A implantação foi tão violenta conosco. Começamos o trabalho com os alunos e na prática construindo as formas mais acessíveis de nos manter conectados. A partir daí, combinando as atividades pedagógicas, mas tudo marcado pelo improviso”, avalia.
Entende que qualquer tipo de sucesso dos alunos, no período, tem quer ser tributado à acessibilidade do professor(a), diante de tantas dúvidas e angústias conjuntas. “Apesar do regramento estabelecido pela universidade, como o uso do Google Classroom, cada professor (a) trilhou caminhos muitos particulares. O acesso, no entanto, aconteceu de forma muito desigual e diferenciada.
Para a docente, o segundo semestre sinaliza que há perigos evidentes, pois mal terminou o primeiro semestre, e em seguida começou o outro. A antecipação permitiu a organização prévia de atividades e também conhecimento das TICs disponíveis, porém os alunos e docentes perceberam o quanto é exaustiva, principalmente os encontros síncronos, que demandam disposição o tempo todo na comunidade virtual, o que tem sido muito cansativo.
Lembra que o novo ambiente requer uma carga energética da qual o/a docente não tem leitura ou conhecimento especializado, nem preparo. “Não conhecemos este universo absolutamente novo, sequer podemos usar a expertise do EAD, em que as pessoas se preparam para isso. Mal começou o semestre e já estamos cansados. A aula sem contato da interação, sem a presença dos gestos e expressões corporais e olhares do aluno, faz o professor(a) dispensar muito mais energia numa aula. Ficar duas, três horas falando com ícones é muito estressante, e muito difícil. No ritmo estabelecido em dezembro estaremos totalmente esgotados e a precarização do trabalho vai gerar influência negativa na qualidade de ensino, agravada pela falta de espaço institucional para ser ouvido e debater estas questões.”
Para o Professor Alexandre Meira de Vasconcelos o fazer pedagógico foi atravessado pela intempestividade do fazer remoto. Revela que houve uma mudança radical no modelo pedagógico utilizado, criando uma situação inédita para todos. Os planos de ensino no início do semestre estavam aprovados, preparados para aula presencial, e tudo foi adaptado, assim houve perda de qualidade acentuada no primeiro semestre, mesmo com os docentes ambientados com tecnologia e que já usavam em aulas.
Explica que todo o plano e estrutura de ensino nas universidades federais estão assentados no modelo presencial. Muitas aulas de laboratórios foram perdidas. Os conteúdos trabalhados com dinâmicas de grupo, as atividades teatrais estão definitivamente perdidas. As relações entre docentes, técnicos e estudantes também são abaladas. Não se vivencia a prática de forma remota, não se faz um experimento à distância e consequentemente a vivência acadêmica tão preconizada é retirada de forma bárbara da vida de jovens calouros. Esta situação, acrescenta, aparece muito forte nas engenharias, nas ciências da saúde, nas biológicas e também nas sociais, áreas que demandam interação com os diversos objetos de ensino, sem tempo para adaptação.
Comenta que o ensino remoto está muito centrado no aspecto cognitivo, de repassar conteúdos para os alunos, de fechar a ementa, atender prazos do MEC e da Universidade. Ressalta que os aspectos afetivos da cognição também são deixados de lado, sem a proximidade dos alunos, substituída por um tipo de empatia virtual, diferente da relação presencial.
Meira aponta ainda o problema da avaliação online. Confessa que mesmo atuando na área de tecnologia teve muita dificuldade no estabelecimento de parâmetros para mensurar a avaliação no primeiro semestre, fato que fragiliza o processo pedagógico.
Destaca que a universidade pública tem uma relação presencial e não virtual com a comunidade acadêmica, baseada na construção de saberes de forma coletiva e mais próxima. O ambiente de sala de aula e a infraestrutura facilitam o modelo de ensino aprendizagem, gerando relações mais produtivas. A forma como a UFMS vem lidando com a pandemia evidenciou a condição precária da vida de muitos dos nossos estudantes, jovens de origem popular, sem Internet, sem notebook, com aparelhos de celular ultrapassados e/ou danificados, sem um espaço de estudo privativo em casa, dividindo poucos cômodos com muitas pessoas, enfim uma situação avessa à aprendizagem e que expõe estas pessoas a diversos constrangimentos diariamente. Há que se destacar também o perigo de contaminação a que muitos de expõem ao buscarem sinal de Internet nos espaços públicos e em cyber cafés e lan houses, espaços tradicionalmente de grande movimento de jovens e de muita proximidade física.
A pandemia alterou profundamente as relações de trabalho e o cotidiano de todos. Na UFMS o trabalho remoto preconizado unilateralmente pela Reitoria evidencioi que não estamos preparados física e mentalmente para o dito home office. Os docentes com doenças degenerativas, com mais de 50 anos são os que mais sofrem. Temos necessidade de permanecer sentados por horas a fio, prática que gera problemas posturais e de visão. Há de se destacar também que o trabalho em home office exige um espaço de trabalho adequado, ergonômico e não é o que se verifica nas residências de muitos.
Apurou-se em diálogo informal com alguns trabalhadores da UFMS que muitos professores não tem mobiliário adequado, outros são recém-chegados ao Mato Grosso do Sul, uma parcela considerável desses indivíduos sustenta duas casas, fato que encarece o custo de vida e torna essencial a esse trabalhador a utilização de um escritório, de uma sala da UFMS para a rotina diária de trabalho.
O adoecimento dos docentes (físico e psíquico) é agravado pelas noticias diárias de falecimento de colegas de trabalho, de estudantes e de familiares. O atordoamento, a condição de prisioneiro que a pandemia estabeleceu por si só imobiliza as pessoas que tem medo de sair à rua, de fazer compras, de frequentar academias ou de realizar uma simples consulta médica.
Assessoria de imprensa da ADUFMS Seção Sindical UFMS