10 abr, 2023
Por Elcio Benini*
Enquanto instituição a escola tem acumulado historicamente uma série de lutas. Nesse processo, acumula e canaliza também uma série de adversários e inimigos, quando:
1. Afirma-se enquanto laica e desmistifica crenças, lendas e mitos, expondo assim formas de dominação e a superioridade do conhecimento científico;
2. Afirma a igualdade de gênero e a não submissão das mulheres, seja na sociedade ou nos ambientes familiares;
3. Afirma que negros, indígenas e povos tradicionais não são inferiores e que reparações históricas são necessárias para que haja alguma igualdade de oportunidade;
4. Afirma que a orientação e/ou determinação sexual não deve ser imposta quando se almeja o livre-arbítrio e a liberdade individual;
5. Defende a liberdade de escolha/de identificação de gênero enquanto direito individual;
6. Desnaturaliza a divisão hierárquica de comando e de classe, apontando para as estruturas tecidas historicamente diante de argumentos de superioridade de raça e linhagem;
7. Apresenta o mimetismo cultural, estético, político, econômico e científico de países periféricos e organizações subalternas como um problema e não como solução;
8. Aponta para a democracia política e a democratização do conhecimento e da riqueza socialmente produzidos como objetivos inquestionáveis.
9. Amplia o conceito de família, não mais idealizada nas figuras de um homem, uma mulher e filhos;
10. Expõe fatos históricos, como golpes militares e resiste a sua militarização.
No bojo das contradições, quando a vara pende para o outro lado, a escola também acumula inimigos quando:
1. É autoritária e reproduz a hierarquia na relação ensino-aprendizagem.
2. Constrói cenários fantasiosos, não encarando o real e a crise estrutural-econômica que se aprofunda;
3. Vende ilusões, como do empreendedor e/ou capitalista de si mesmo, negando assim a crise estrutural-tecnológica que acomete o mundo do trabalho;
4. Advoga a neutralidade, não encarando os problemas reais dos estudantes e respectivos territórios;
5. Se transforma em uma organização funcional de controle de corpos e mentes, cercada de grades, cercas e câmeras;
6. Mimetiza a empresa, transformando a competição em valor e a empatia, cooperação e solidariedade em exceções.
7. Apresenta a desigualdade como natural e fundamento do esforço individual e da meritocracia.
8. Não discute temas fundamentais, como religião, aborto e formas legítimas de lutas.
Como se pode perceber, não obstante a regulação das mídias sociais e internet, a não propagação midiática de “salvadores” e “defensores” de fanatismos de toda a ordem e o desarmamento sejam medidas necessárias e pautadas em evidências científicas, o problema, suas causas e soluções são muito mais complexos do que vem sendo apresentado. Enquanto uma parcela significativa da sociedade e as instituições escolares não enfeixarem um projeto viável e alternativo de produção econômica e reprodução política e cultural, a história continuará se repetindo, não mais como tragédia, mas como projeto de dominação e poder.
*Elcio Benini é professor, sonhador e militante da autogestão (também doutor em Educação).