Projeto de extensão visa regularizar Cinturão Verde, ameaçado em Três Lagoas

O município de Três Lagoas planeja alterar a destinação da área conhecida como Cinturão Verde para a construção de unidades habitacionais e instalação de indústrias ou empresas de serviços. A mudança afetaria diretamente os agricultores familiares, alguns dos quais estão na terra há mais de 30 anos, e que serão “realocados” para áreas distantes da cidade, a cerca de 60 km, ou poderão receber unidades habitacionais.

Em abril de 2023, foi iniciado um projeto de extensão coordenado pelo professor Evandro Carlos Garcia, da UFMS, voltado para a regularização fundiária do Cinturão Verde. O projeto é fundamentado nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, especialmente o ODS 16, que visa promover sociedades pacíficas e inclusivas, assegurar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes e responsáveis.

O pesquisador também está conduzindo uma pesquisa de doutorado sobre o Cinturão Verde, analisando a implementação dos ODS, como acabar com a fome (ODS 2), promover saúde e bem-estar (ODS 3), e assegurar a gestão sustentável da água (ODS 6), entre outros.

O Cinturão Verde, formalmente reconhecido em 1991, existe desde a década de 1980 e desempenha um papel crucial na preservação ambiental e na subsistência de uma comunidade agrícola consolidada. Contudo, a área enfrenta pressões políticas e econômicas devido à valorização imobiliária provocada pelo desenvolvimento da infraestrutura rodoviária na região.

Garcia destaca que “a construção do prolongamento da BR 262 e o desvio da rota de transporte de cargas despertaram interesse político-econômico sobre a região, valorizando as terras do Cinturão Verde”. Ele também critica o município por não considerar os impactos ambientais e sociais dessa decisão de alterar a função social daquela área, em flagrante descumprimento do princípio da vedação ao retrocesso ambiental, que tem matriz no direito constitucional ao meio ambiente equilibrado.

O Cinturão Verde integra uma Unidade de conservação ambiental, a APA Jupiá, e os projetos do município conduziram à extinção dessa APA.

O professor aponta a falta de respostas do poder público a vários requerimentos feitos pela Aspatrês, associação que representa os agricultores, solicitando estudos ambientais sobre a alteração da destinação da terra. Ele destaca que os agricultores do Cinturão Verde têm resistido às pressões econômicas e políticas, mantendo a integridade da área.

O Cinturão Verde também contribuiu significativamente para a recuperação de terras degradadas e preservação ambiental, beneficiando a fauna e flora locais. Estudos da UFMS indicam que a área tem um papel crucial na mitigação de problemas ambientais na APA Jupiá e na melhoria das condições climáticas da região.

Garcia acusa o poder público municipal de negligência em sua função de fiscalização e não satisfazer os direitos dos agricultores já previstos em lei municipal, além de condutas que enfraqueceram e desestruturaram a comunidade rural do Cinturão Verde. Ele observa que, ao longo dos anos, contratos firmados com os agricultores garantiam segurança jurídica e esperanças de propriedade dos lotes, mas foram gradualmente desrespeitados pelo município.

O professor critica a postura do poder público, que, segundo ele, visa desmotivar e desestruturar a comunidade agrícola através de pressões e falta de apoio. Ele menciona que “o município tem negado serviços essenciais, oferecido obstáculos à renovação de contratos e implementado notificações abusivas, gerando angústia e incerteza”.

Ainda assim, Garcia destaca que a comunidade de agricultores familiares permanece mantendo a esperança de regularização e continuidade de suas atividades no Cinturão Verde, um território que desempenha um papel crucial tanto na sustentabilidade ambiental quanto na segurança alimentar da região.