Interventores geriam a universidade desde 2019
Após três anos de intervenção, o professor Jones Dari Goettert foi nomeado como novo reitor da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), nesta quinta-feira (23). Jones leciona na Faculdade de Ciências Humanas (FCH). A UFGD passou por processo eleitoral em 2019, mas o resultado foi ignorado.
Na ocasião, o professor Etienne Biasotto foi eleito por consulta à comunidade acadêmica com 29,83% do total de votos e por 82,25% no Colégio Eleitoral, instância responsável pela eleição. O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação judicial questionando a validade do processo eleitoral.
Após o fim do mandato vigente da gestão anteriormente eleita e com a judicialização do processo eleitoral, o então ministro da Educação, Abraham Weintraub, nomeou a professora Mirlene Damázio como reitora pró-tempore. Em fevereiro de 2021, durante a gestão do ex-ministro Milton Ribeiro (atualmente preso), Mirlene foi substituída por Lino Sanabria.
O presidente da AdufDourados, Alexandre Bergamin Vieira, destaca o caráter antidemocrático da intervenção. “O projeto da gestão intervencionista foi de desmonte e sucateamento da universidade. Foram anos em que a universidade sequer teve um centavo de verba de investimento, em 2021, e de emendas parlamentares, em 2021 e 2022”, pontua o professor. “Os órgãos colegiados foram calados por vários meses, a democracia foi enterrada. Inclusive com intervenção na Faculdade de Educação, qua ainda tem um interventor”, conclui.
Mobilizações
Ambas as gestões passaram por resistência da comunidade acadêmica, tanto por parte de estudante, quanto de docentes e servidores, devido à forma antidemocrática com que foram empossadas e pelo alinhamento à política neoliberal de desmonte da educação superior pública.
No dia 10 de junho, representantes da AdufDourados, do Sintef, centros acadêmicos, DCE e outros membros da comunidade acadêmica fizeram um ato no prédio da Reitoria, em repúdio aos três anos de intervenção do Ministério da Educação (MEC) na instituição, ocorrida em 11 de junho de 2019. Os atos contaram com aulas públicas e com o “Arraiá da Democracia”, que uniu festa junina e manifestação política.
Os manifestantes também pediam o desbloqueio dos 7 milhões de reais previstos para o orçamento da UFGD anunciado pelo MEC no dia 26 de maio. Como parte dessas ações, no dia 9 de junho, cerca de 260 acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (Leduc) e da Faculdade Indígena (Faind) ocuparam o prédio da Reitoria na Unidade I. A ocupação durou até o dia 11. Os manifestantes reivindicavam a garantia de direitos como transporte, alojamento e alimentação para estudantes camponeses e indígenas.
Josiane Gonçalves, acadêmica de Educação do Campo, explica que a ocupação também teve como objetivos a garantia de bolsas e a permanência do curso. “A reitora Eliane já falou, em 2017, que não teria futuro para a Leduc. Reitor ou interventor, a luta é manter nosso curso”. Ela afirma que o sucateamento do curso foi consolidado durante o atual governo. “Depois da pandemia, a gente descobriu que não tinha direito a alimentação, moradia, que não existia recurso”.
A estudante também aponta que a repressão policial aos estudantes foi ameaçadora e violenta. “Tarde da noite, chegaram uns cinco policiais, sem caracterização. Mostraram armas, um deles ficou exibindo a arma, como forma de intimidação. A forma como a própria secretária reagiu foi violenta, nos tratou muito mal, até que saiu a ordem de reintegração de posse”.
Josiane espera que o novo reitor abra diálogo com a Leduc e com a Faind. “A gente pode chegar em agosto, quando começa a nova etapa, e não ter nada. Não ter alojamento, transporte e alimentação. Espero que o reitor tenha interesse, abrace nossa causa, que vai muito além de eu me formar. É não virar todas as armas institucionais para destruir uma faculdade onde quem está presente são os indígenas, os negros, os sem-terra, os LGBTQIA+”, pontua. Ela espera que o professor Jones possa se reunir com estes alunos para debater suas reivindicações. “Gostaríamos de saber como se posiciona, a gente quer conversar com ele”, conclui a acadêmica.
Taíza Falkembak, também acadêmica da Educação do Campo, afirma que “as mobilizações mais ativas foram possíveis com a volta das etapas presenciais neste ano de 2022”. Taiza explica que o acesso à tecnologia digital é mais difícil para os acadêmicos que vivem em áreas afastadas da cidade. “A maioria dos estudantes da Faind são povos que vivem em aldeias, assentamentos, quilombos e beiras de rios, onde o acesso à internet diário é em geral uma dificuldade, e faz com que a mobilização online seja um grande desafio”, aponta.
Taíza acredita que a gestão interventora teve papel decisivo para a implementação de políticas de desmonte das universidades públicas, em alinhamento com a administração de Jair Bolsonaro. “Essa gestão basicamente executou o projeto de desmonte da educação de acordo com o atual desgoverno, que permitiu essa intervenção dentro da UFGD”, aponta. Para ela, a política intervencionista “soube manejar muito bem as condições para inviabilizar as etapas presenciais na Faind, desestabilizar professores e estudantes através das incertezas de alojamento e alimentação”.
Norberto Liberator, com informações da AdufDourados
Foto: Iara Cardoso